quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

1144 - 1146

Amanha é dia de partir, portanto achei que devia dizer adeus a Jos, o meu vizinho. 

[pausa]

Revi neste momento todo a conversa que mantive com ele, e acredito cada vez mais que a distancia que existe no nosso caminho é a suficiente para enriquecer a vida de cada um.

Sentados no sofa, a ver televisao, sem olhar para horas. Cerveja na mao. Partilha de histórias. 

Fui jantar em 20 minutos e voltei com o portatil. "I wanna show you something, Jos!"

E durante uma hora, mostrei onde fica Faro e Trás-os-Montes; mostrei como se distingue a minha casa em Lisboa das restantes, por satelite; falei-lhe dos Açores e da Madeira. E se a atençao dele era desviada pela televisao, tambem eu nao deixava de olhar para o jogo de futebol. 

Ele estava fascinado. Ele estava a aprender o pouco que eu lhe podia ensinar. Mas estava a aprender. E aos 77 anos, creio que Jos está a fazer a viagem mais confortavel que podia fazer, a Portugal.

Isto foi a minha história. 

A história dele foi um desabafo de vida.

"Do you know, André, that every morning I wake up and I said always the same 'I can do whatever I want!' ? ", e riu-se. Nesse momento confirmei aquilo que já tinha dito, Jos parece que está num final de dia enorme, que nao acaba. E naquele olhar que ele re-lançou à televisao, percebi que a sua simplicidade de vida era isso mesmo: um descanso.

Falou entao numa das profissoes que teve. A certa altura disse: "I was always working. Then my wife gave me life". E um olhar de relance na fotografia que enriquecia a parede do outro lado da sala fez-me perceber que tambem o seu descanso era conformismo.

Se sempre que for a casa de Jos voltar com pensamentos e reflexoes de vida para semana e meia, vou sair da Holanda completamente renovado.

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